sexta-feira, 29 de maio de 2015

Carta de Rodin sobre seu processo de criação

            Rodin. São João Batista.

Uma manhã, batem na porta do ateliê; vejo entrar um italiano acompanhado por um de seus compatriotas, que já havia posado para mim. Era um camponês, de Abruzzes, distante da cidade de seu país natal, e que veio se propor como modelo. Ao vê-lo, fui tomado de admiração; este homem rude, hirsuto, exprimia em seu modo de andar, em sua força física, toda a violência, mas também toda a característica mística de sua raça.
Pensei, imediatamente, em um São João Batista, quer dizer, um homem da natureza, um iluminado, alguém que acredita; um precursor que veio anunciar alguém maior do que ele. O camponês se despiu, subiu na mesa giratória como se não tivesse jamais posado; ele se instala, a cabeça levantada, o dorso reto, sustentando-se sobre as duas pernas abertas como um compasso.

O movimento estava tão justo, tão caracterizado e tão verdadeiro que eu exclamei: “Mas é um homem que caminha!” Resolvi imediatamente fazer o que eu havia visto. Tinha-se o hábito, quando se examinava um modelo, de lhe dizer: “caminhe”, quer dizer, de lhe fazer transportar todo o equilíbrio do corpo sobre uma única perna; acreditava-se assim encontrar movimentos mais harmoniosos, mais elegantes, a fim de proporcionar o que chamam de “expressão”. Só de pensar em colocar o equilíbrio de uma figura sobre as duas pernas parecia uma falta de gosto, um ultraje às tradições, quase uma heresia. Eu já estava decidido, obstinado. Eu só pensava que não poderia haver falhas; pois se não traduzisse a minha impressão tão exatamente quanto a havia recebido, minha estátua seria ridícula e todos me ridicularizariam. Eu me prometi então o modelar com toda a minha vontade. É assim que fiz sucessivamente O homem que caminha e o São João Batista. Eu fiz apenas copiar o modelo que o acaso havia me enviado.
Rodin. O homem que caminha.


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