Entrevista de Heidegger ao L ‘Express por ocasião das comemorações
de seus 80 anos - publicada no Caderno B
do Jornal do Brasil, em 01 de novembro
de 1969.
MARTIN HEIDEGGER AOS 80 ANOS: O MAIS IMPORTANTE É AINDA PENSAR
- O senhor é considerado como o último
filósofo da tradição ocidental, aquele que termina esta tradição e também como
aquele que tentou abrir uma outra maneira de interrogar.
Hoje, a crise da Universidade é acompanhada de
uma suspeita crescente quanto ao próprio sentido da filosofia. Para muitos,
esta não tem mais razão de ser, tornou-se inútil...
- Mas é o que
eu sempre pensei. Em meu curso Introdução
à Metafísica, de 1935, eu já afirmava: a filosofia é sempre intempestiva. É
uma loucura.
- Uma loucura?
- A filosofia é
essencialmente intempestiva porque pertence a essas raras coisas cujo destino é
nunca poder encontrar ressonâncias imediatas.
- Que
representa então a filosofia?
- É uma das
raras possibilidades de existências autônoma e criadora. Seu dever inicial é
tornar as coisas mais pesadas, mais difíceis.
- Pode ela então, segundo sua opinião, ter
um papel na transformação do mundo, como queria Karl Marx?
- A filosofia
não pode nunca, de maneira imediata, trazer as forças ou criar as formas de
ação e as condições que suscitam uma ação histórica.
- Mas, qual é seu sentido?
- Não é um saber que se possa adquirir e utilizar
diretamente. Só diz respeito a um número restrito de homens. Não pode ser
apreciada por critérios comuns. Não se pode fazer alguma coisa com ela: é ela
que faz alguma coisa de nós, se nela nos engajamos.
- O
senhor pode precisar o que quer dizer?
- No decorrer
de seu desenvolvimento histórico, os povos se fazem sempre muitas perguntas.
Mas esta é a única pergunta - “Por que há nisso o ser em vez de nada?” - o que
decidiu todo o destino do mundo ocidental, através de respostas que a ela foram
dadas pelos pré-socráticos, há 2 500 anos. E hoje, no entanto, o sentido dessa
pergunta não inquieta mais ninguém.
- O senhor afirma de bom grado que estar
atento à essência do mundo presente é meditar as sentenças dos pensadores
pré-socráticos: Parmênides, Heráclito...
- Sim, mas
hoje, na Alemanha ou outros lugares, eles não são mais lidos.
- Que laço une, segundo o senhor, a esses
pensadores tão longínquos?
- Em meu curso Introdução à Metafísica demonstrei por
que todas as perguntas da filosofia começavam com eles. Foi em suas sentenças
poéticas que nasceu o mundo ocidental.
- É verdade que desde 1907, sem nenhuma
exceção, o senhor lê durante uma hora pelo menos, os pensadores e os poetas
gregos: Homero, Píndaro, Empédocles, Sófocles, Tucídides?
- Todos os
dias. Salvo durante os anos da guerra.
- O senhor pensa que seja preciso retornar
às fontes do pensamento grego?
- Retornar? Um
renascimento moderno da Antiguidade? Seria absurdo, e, aliás, impossível. O
pensamento grego só pode ser um ponto de partida. A contribuição dos pensadores
gregos ao nosso mundo nunca esteve tão presente.
- Mas, atualmente interroga-se mais Marx,
Freud, ou ainda Marcuse, que Parmênides e Heráclito.
- É o que eu
digo.
- É este laço entre a metafísica dos gregos
e a técnica moderna que o senhor queria destacar dizendo que de certa maneira a
bomba atômica tinha começado a explodir no poema de
Parmênides, há dois mil e quinhentos anos?
- Sim, mas é
preciso desconfiar das fórmulas privadas de seu contexto. Penso, de fato, que é
no poema de Parmênides, e na interrogação que ele estabelece que a
possibilidade da ciência futura se colocou em marcha. Mas o perigo da fórmula
seria fazer crer que se trata, aí, de um processo inelutável, de uma
necessidade fatal do tipo hegeliano.
- O senhor é representado, às vezes, como
contrário à técnica a ao mundo moderno?
- Absurdo. O
que importa é o futuro.
- O senhor foi o primeiro a falar de “era
da técnica planetária.” Que entende por isso?
- A era
planetária, e era atômica, são expressões que designam a aurora dos tempos que
estão vindo. Ninguém pode prever o que serão. Ninguém sabe, então, o que será o
pensamento.
- A época da técnica planetária marca o fim
da metafísica?
- Não. Ela é
sua consumação. Sem Descartes, o mundo moderno teria sido impossível.
- Como o senhor coloca o problema da
técnica?
- Enquanto nos
contentarmos em maldizer a técnica ou glorificá-la, não conseguiremos nunca
perceber o que ela é. É preciso questioná-la.
- O que quer dizer “questionar” a técnica?
- Questionar,
como eu disse, é trabalhar em um caminho, construí-lo. Questionar a essência da
técnica é preparar uma relação livre com ela. A técnica não é a mesma coisa que
a “essência” da técnica.
- E se não pensamos esta essência da
técnica?
- Então,
afirmando-a com paixão ou negando-a, ficaremos acorrentados e privados de
liberdade. Pois a técnica não é alguma coisa de neutro. É justamente quando
imaginamos que ela é neutra, que nos entregamos à ela para o pior.
- Segundo o senhor, o mundo moderno ainda
não “pensou” a técnica?
- Escrevi em
uma conferência: “À força de técnica, não percebemos ainda o ser essencial da
técnica, como à força de estética, não preservamos mais o ser essencial da
arte.”
- A técnica é para o homem o supremo
perigo?
- Vocês
conhecem o que disse Hölderlin: “Mas lá onde cresce o perigo, cresce também o
que salva.”
- Como conceber a relação da filosofia e da
ciência?
- É uma
pergunta muito difícil. A ciência está estendendo seu poderio a toda a Terra.
Mas a ciência não pensa. Pois sua marcha e seus meios são tais que ela não pode
pensar.
- É um defeito?
- Não, uma
vantagem. É justamente porque ela não pensa que a ciência pode se estabelecer e
progredir em seus domínios de pesquisas.
- Mas hoje, no entanto, existe tendência a
identificar o próprio pensamento à ciência.
- E só quando o
abismo que separa a ciência do pensamento é enfim reconhecido, que a relação da
ciência e do pensamento torna-se autêntica.
- O senhor diz: “A ciência não pensa.” Não
é uma afirmação chocante?
- Certo, mas a ciência não pode nada
sem o pensamento. E como repeti em meu ensino: a coisa mais importante em nossa
época é que não pensamos ainda verdadeiramente.
- O que o senhor quer dizer?
- Talvez que,
há séculos, o homem agiu muito e pensou pouco demais. Em um mundo que nos dá
sempre mais a pensar, o pensamento ainda não existe.
- Onde o senhor se situa no tempo? Muito na
frente?
- Ou talvez
muito longe, atrás, no passado... “O mais antigo do pensamento está atrás de
nós e, no entanto, sobrevém.” Viemos muito tarde para os deuses e cedo demais
para o Ser.
- Um quarto de século nos separa hoje da
aparição de sua obra principal: Sein
und Zeit - Ser e Tempo. O senhor acha que é mais bem compreendido?
- Não sei. Não
segui todos os trabalhos que escreveram sobre mim. Nos Estados Unidos,
prepara-se uma edição completa de minha obra. Mas nem sempre reconheço meu
pensamento em certas interpretações americanas.
- Em uma bibliografia que apareceu em 1945
e onde são citados mais de 820 trabalhos consagrados ao seu pensamento, o
editor acreditou poder dizer que o interesse que sua obra suscita enfraquece
nitidamente no mundo.
- Sim, e o que
é engraçado, é que os textos consagrados a meus trabalhos triplicam depois.
Disseram-me que ultrapassam mesmo, acredito, o número de três mil.
- O senhor acompanhou as pesquisas de seu
antigo aluno Herbert Marcuse?
- Marcuse preparou em Friburgo, sob minha
direção, sua tese sobre Hegel em 1932. É um ótimo trabalho. Em seguida, não
acompanhei todas as suas pesquisas. Li O
Homem Unidimensional.
- Alguns acreditaram achar relação entre as
perguntas de Marcuse e sua problemática.
- Não é
impossível.
- Marcuse reconhece, por exemplo, que a
técnica moderna não é uma simples acumulação de máquinas, mas uma ordem
planetária. Que o homem a ela está atualmente entregue muito mais que, em
realidade, a domina.
- Escrevi isso
frequentemente.
- E a questão que Marcuse coloca é a do
destino do homem no seio desse domínio. A técnica é para ele uma forma de existência
mundial que faz de toda vida uma servidão ao labor.
- É, isto é
Heidegger. Escrevi, no mesmo sentido, que o totalitarismo não era uma simples
forma de Governo, mas muito mais a conseqüência desse domínio desenfreado da
técnica. O homem está hoje entregue ao vertígio de suas fabricações
- O senhor pensa que, em suma, Marcuse
desenvolveu em uma perspectiva revolucionária, o que o senhor mesmo pensava
desse domínio da técnica planetária?
- Sobre o
próprio terreno de minha problemática, penso que não. A questão do Ser não é a
questão de Marx. Isto não quer dizer que a obra de Marx seja menos importante
que a de Hegel, ou estranha à metafísica. O Ser é pensado por Marx como
Natureza que se trata de dominar, de domar. Marx continua o modo dos
hegelianos.
- Continua lendo Marx?
- Relia
recentemente seus escritos de juventude. Acompanhei, aliás, os trabalhos de meu
aluno Landshut, que os publicou em 1923. Tinha a intenção de fazer sobre esses
textos, no verão passado, um seminário privado com os professores das
democracias populares que tinham me pedido isso.
- E Freud?
- A psicanálise
é uma disciplina muito importante. Acredito nela, sobretudo, como terapêutica.
Mas suas posições filosóficas são insustentáveis.
- Por quê?
- Porque elas
tornam biológica a essência do homem. Releiam Além do Princípio do Prazer, de Freud.
- Ainda uma vez, o senhor pensa que entre o
marxismo e sua filosofia, possam se efetivar “pontos de encontro” no futuro?
- Talvez, por
que não? Mas não saberia dizer ainda como. Recebi cartas e mesmo visitas de
intelectuais de países socialistas: tchecos, poloneses, iugoslavos, russos...
- Perguntaram-lhe, um dia, se escreveria
uma Ética, uma doutrina de ação?
- Uma Ética? Quem pode se permitir hoje, e em
nome de que autoridade, de propor uma ao mundo?
- O senhor escreveu: “O ser humano é sua
própria possibilidade” Tema desenvolvido por Jean-Paul Sartre em L’Etre et
le Néant.
- Sartre
interpretou frequentemente meu pensamento num sentido marxista. O homem é sua
própria possibilidade, mas não pode se produzir
ele mesmo.
- Reprovam-lhe às vezes a distância que o
senhor parece tomar em relação aos acontecimentos da história mundial.
- O pensamento
é sempre um pouco solidão. Do momento em que o engajamos, ele pode desviar. Sei
alguma coisa sobre isso. Aprendi-o em 1933, por ocasião de meu reitorado, num
momento trágico da história alemã. Enganei-me. Um filósofo engajado é ainda um
filósofo? A maneira pela qual a filosofia age realmente sobre os homens e sobre
a História, que sabe disso o próprio filósofo? A filosofia não se deixa
organizar.
- Falou-se muito de uma influência que
teria exercido sobre o senhor - e em particular sobre a gênese de Ser e Tempo -
a obra do marxista húngaro Gyorgy Lukacs.
- Acho que Lukacs
não gosta muito de mim...
- Fizeram, no entanto, em Paris, cursos
sobre o tema Heidegger e Lukacs, pontos de convergência e de divergência.
- Estou
espantado. E isto me dá vontade de sorrir. Em um número de Der Spiegel, de março de 1966, Lukacs me tratava de filósofo
fascista. Não me lembro, aliás, de ter lido Lukacs antes de escrever Ser e Tempo. Não, eu não o li.
- O senhor foi muito atacado?
- Muito pouco, hélas! de maneira filosófica. De todos
esses ataques, pergunto-me se ficou um só trabalho que conte. E vocês conhecem
o que disse Valéry: “Quando não se pode atacar um pensamento, ataca-se o
pensador.”
- Essas controvérsias ainda prosseguem?
- Elas se
estenderão até minha morte. Afinal de contas, Heidegger não tem nenhuma
importância. O futuro é a equipe de pesquisas. Sabemos por exemplo, o nome dos
artesões das catedrais? Mas ninguém, hoje, leria um de meus livros, se ele não
estivesse assinado Heidegger. A maioria das pessoas acredita, aliás, que morri.
Há muitos mal-entendidos. Escreveram mesmo que eu tinha redigido O que é a Metafísica, esquiando na
Floresta Negra!
- Esses mal-entendidos o perturbam?
- Tenho a
impressão de que é Heidegger quem perturba.
- Que quer dizer?
- O essencial é
que meu trabalho, se tem alguma importância, faça seu caminho. Não se saberá
mais nem meu nome. O que é válido em meu pensamento é que contará ou não no
futuro.
- Ao longo de sua vida, o senhor só colocou
uma questão: a do Ser. Uma tal questão ainda parece hoje tão primordial?
- Sim, ela
guarda todo seu sentido.
- É possível repetir Heidegger?
- Em nenhum
caso. O que é preciso não é que me imitem, mas que cada um crie suas próprias
questões. Seguir Heidegger não tem nenhum interesse. É preciso ou prolongar
minha problemática em outras direções, ou então contradizê-la.
- “É preciso pensar Heidegger contra
Heidegger”... dizia o senhor em seu cursos.
- E é também o
que sempre tentei fazer eu mesmo! Durante 30 anos não fiz um só curso sobre
Heidegger.
- E, no entanto, fala-se de “filosofia
heideggeriana”?
- Eu já o
disse: a filosofia heideggeriana não existe. Há 60 anos tento compreender o que
é a filosofia, e não tento propor uma.
- Tentaram, às vezes, aproximar o
encaminhamento de seu pensamento a partir das influências que o marcaram. Que
pensa disto?
- Fui, é claro,
marcado por toda a tradição. Mas este modo de educação é tipicamente
universitário: “Heidegger e Hegel”, “Heidegger e Schelling”... Acreditando em
alguns comentaristas, pegando Aristóteles, Husserl, Brentano, misturando tudo,
dá Ser e Tempo. É cômico.
- Como conhece a missão que hoje pertence
ao pensamento?
- Para mim é
difícil desenvolver este ponto, pois o que escrevi sobre o assunto não
publiquei. Reencontrar a questão inicial do Ser, tal foi a preocupação que
suscitou Ser e Tempo. A segunda parte
devia se intitular Tempo e Ser.
- Há
um espanto bastante freqüente devido a uma quebra singular sobrevinda em sua
obra. Falou-se de um Heidegger I e de um Heidegger II. Bruscamente, sobreveio
uma mudança de estilo. Parece que o senhor deixou o caminho árido da
interrogação metafísica e interroga os poetas, Hölderlin, Morike, Hebbel, Rilke
e, sobretudo, Trakl.
- Eu escrevi: a
filosofia e a poesia mantêm-se sobre montes opostos, mas dizem a mesma coisa.
- O senhor pensa que seja possível
distinguir um Heidegger I de um Heidegger II, como o fazem os comentaristas
americanos?
-
Absolutamente. O Heidegger II só é possível pelo Heidegger I e o Heidegger I
implicava já no Heidegger II.
- E seu novo estilo de interrogação,
digamos poético, depois de Ser e Tempo?
- Só é uma
curva. Minha conferência sobre A
Essência da Verdade é disso, de certa maneira, a dobradiça. Colocando em
minha obra a primeira questão, eu ignorava como se apresentaria mais tarde a
segunda.
- Digamos as coisas francamente. Muitos
estudantes abrem seus livros com a impressão de se achar em face de um
pensamento tão difícil e tão pouco comum que lhes parece, às vezes, que ele
encara certos problemas no sentido inverso do ensinamento tradicional. O senhor
conserva o silêncio há muito tempo. Só, diante de seus livros, não acredita que
o estudante possa encontrar-se desamparado?
- Infelizmente,
sim. Mas que fazer? Há também o problema das traduções. Como controlá-las? Tive
que renunciar a acompanhar as traduções japonesas. Quanto aos estudantes, o que
eles fazem freqüentemente é catar conhecimentos aqui e lá. Mas podem eles fazer
outra coisa na Universidade de hoje?
- O senhor não faz mais cursos, não dirige
mais seminários. Só seus livros continuam.
- O que mais
falta é o diálogo dos seminários com uma dezena de estudantes. Então somente,
pode-se fazer ver, mostrar o que
está em questão na filosofia.
- O senhor acompanhou o movimento mundial
dos estudantes e a colocação da Universidade em questão?
- Eu já havia
encontrado os problemas da Universidade, em 1929, em O Que é a Metafísica? Hoje, os estudantes se revoltam. É bom. Mas
sabem eles realmente o que querem? O que eu sei há muito tempo é que a
Universidade se tornou um simples colégio, uma escola. Não permite mais o
aprendizado do pensamento, só proporciona um amontoado de conhecimentos. A
velha Universidade está morta, e era sem dúvida uma morte necessária.
- Que pensa das novas doutrinas que parecem
ter ganho as universidades no mundo inteiro?
- Penso que a
crise que a Universidade vive hoje é capital. Mas, repito, não é toda nova.
Numerosos problemas, que são debatidos atualmente, na Alemanha e outros
lugares, encontrei-os em minha juventude estudantil, na aurora da II Guerra
Mundial. Mas o tempo de colocar essas questões não era ainda vindo.
- Muitos de seus alunos lembram-se dos
ataques que o senhor lançava, em seus cursos, contra as teorias do
nacional-socialismo, e das condenações ao racismo.
- Tudo isso
acabou para mim. O que é importante é a juventude, hoje, que se apaixona por
problemas novos, que começa um mundo novo. Amo-a muito e é ela que é
interessante.
- Pensadores japoneses dizem descobrir, há
muitos anos, profundas analogias entre sua filosofia do ser e o pensamento
oriental.
- De fato.
Alguns vieram aqui. Suas atividades me interessaram muito. Vários escreveram
mesmo que minha obra representa para eles uma espécie de traço de união entre o
Este e o Oeste, a Ásia e o Ocidente.
- É através do livro de Sartre, L’Étre
et le Néant, que muitos o descobriram na
França, após a Libertação. E também o existencialismo, do qual o senhor foi
feito o pai.
- O
existencialismo era de certa maneira, um contrassenso. Mas Sartre não foi
responsável. Estimo-o muito. Para um filósofo alemão é espantoso um homem que
sabe exprimir-se, a um só tempo, filosoficamente e pelo romance, teatro e
ensaio. Esta faculdade dos franceses me sensibiliza muito. Foi um príncipe
japonês que trabalhou comigo por volta de 1929, que levou minha obra à Sartre,
em Paris. Por outro lado, só pude ler L’Etre
et le Néant, em 1945.
- Recentemente o senhor se interessou por
outros trabalhos filosóficos?
- Hoje, o que
se chama filosofia raramente é outra coisa que não seja um decalque das
ideologias técnicas emprestando os métodos próprios à física e à biologia. Não
é mais uma interrogação filosófica autêntica.
- Os artistas falam bastante, hoje, de uma
nova união da arte e da técnica.
- Arte e
técnica são um enorme problema. Na arte dos gregos, o pensamento estava já como
que implicado.
- Começa-se a utilizar a cibernética na
arte moderna.
- Atenção para
a cibernética. Vai-se perceber que não é assim tão simples.
- Não gosta que se fale do senhor?
- Para entrar
no grande circo, no teatro, no carnaval de boatos inúteis? O essencial não está
nisso.
- O senhor renunciou definitivamente a toda
vida pública?
- Sou sempre
convidado para congressos, colóquios, e mesmo para certas cerimônias oficiais.
Devo recusar tudo. Minha última conferência sobre arte foi feita em Atenas,
seis dias antes do golpe de estado militar. A maioria de meus ouvintes deve
estar na prisão. Aqui, os visitantes vêm seguidamente soar à minha porta. Vivo
retirado, mas o solitário não é forçosamente amargo.
- O senhor diz que hoje as questões passam
despercebidas, que os problemas essenciais não são colocados. Acredita que, no
futuro, serão colocados?
- Quem sabe?
Talvez somente em dois ou três séculos...
(Copyright L’Express-JB)
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